Ex-Governadora do RS, 2007 a 2010 |
Há uma tradição durante o mês de janeiro no Rio Grande do Sul que, sempre esperada, quando chega o dia dá um colorido todo especial ao verão normalmente muito quente e muito seco típico do estado. É o dia do "listão" da Universidade Federal, quando os resultados dos vestibulares alegram milhares de novos calouros e suas famílias, pois abrem a porta de acesso à universidade gratuita e muito bem avaliada. Assim foi na última sexta feira (25). Festa, buzinaria, e o estado todo – principalmente o litoral – se enchendo de faixas "parabéns, bixo" identificando curso e nome nas janelas das casas e apartamentos. Redes sociais registrando "entrei", e "que orgulho minha filha é a mais nova caloura" etc, junto com outras mensagens de "formado" pelas conclusões dos cursos.
Este domingo foi amanhecendo belíssimo. Sem nuvens no céu, fresquinho, sol especial acompanhando a lua cheia magnífica que se despedia. Desejei "bom dia" no twitter e no facebook. Imediatamente mensagem do amigo "liga na rádio que há um incêndio com mais de 100 mortos, em Santa Maria". Cem mortos, algum engano, me belisquei. Segui os tt e sim, a cada minuto aumentava o número. Para o mundo!
Não foram 100. Foram 231 mortos. Mais de uma centena a mais pelos hospitais. Jovens e seus amigos e famílias festejando a entrada em curso ou o final de ano em cursos na universidade que, atrasada por uma greve, estimulava a festa que era de todos. Incêndio começado de madrugada. Como tantos podem morrer em tão pouco tempo numa discoteca tradicional numa cidade universitária?
Não foram 100. Foram 231 mortos. Mais de uma centena a mais pelos hospitais. Jovens e seus amigos e famílias festejando a entrada em curso ou o final de ano em cursos na universidade que, atrasada por uma greve, estimulava a festa que era de todos. Incêndio começado de madrugada. Como tantos podem morrer em tão pouco tempo numa discoteca tradicional numa cidade universitária?
Aberta a sala de crise, foi-se tendo a dimensão da tragédia. A maior de todas. A perda de um jovem já entristece. Mas 231, não se dimensiona. Na arapuca que se viu ser a tradicional casa noturna que tantas vezes já havia recebido para celebrações. Pilhas de jovens, relatavam-me os que foram por dever de ofício ao local de madrugada e lá entraram. E de modo organizado, foi o número (infinito!) de jovens mortos a serem reconhecidos pelos seus, como depois se viu no Centro Desportivo Municipal. A equipe treinada comandando a sala de crise permitiu que não fosse mais terrível ainda a cena dos que procuravam pelos hospitais e, não encontrando, com todo o peso do mundo se dirigindo para o CDM organizado para atender os parentes e amigos no pesadelo do processo de reconhecimento até a despedida. A dor deles todos sentimos, tontos todos ficamos, cada jovem uma história, um sonho, um futuro ceifado.
A imprensa, a mídia, cumprindo seu papel, se organizou para informar e aprender, afinal nunca antes houve um desastre como esse. O governo federal juntou-se às instituições locais, hospitais, equipes, doações – Santa Maria também Base Aérea – a solidariedade de todo o país se fazendo presente. Relatos dos sobreviventes, analistas listando outras tragédias assemelhadas e o que veio depois.
As despedidas fazemos hoje. Mais não podemos fazer hoje senão o abraço e a solidariedade. Milhares seguirão chorando. É muita dor. O país se manifesta e chora junto. Aí começa o que importa a todos nós, a quem cabe principalmente a vigilância: não pode se repetir! Nenhuma praça, nenhuma cidade, nenhuma casa noturna, nenhum responsável público, nenhum grupo musical, pode dizer que "não sabia, como poderia saber?". Hoje sabemos. Não há argumento que adie a mudança – este domingo não é para se esquecer. Se queremos que não se repita.
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