Cadê os Direitos Humanos, dona Maria do Terço?
Dezessete dias depois do incêndio que destruiu a base brasileira na Antártica, as famílias do sargento da Marinha Roberto Lopes dos Santos, de 45 anos, e do suboficial Carlos Alberto Vieira Figueiredo, de 47 anos, mortos tentando combater o fogo na Estação Comandante Ferraz, ainda sofrem para enterrá-los. Os corpos chegaram em 28 de fevereiro à Base Aérea do Galeão, vindos de Punta Arenas, no Chile, e só foram liberados pelo Instituto Médico-Legal (IML) do Rio na última sexta-feira, depois de feitos os exames de DNA. Os corpos, no entanto, continuam no IML. Revoltados com a demora, os parentes reclamam que as informações sobre o caso são desencontradas. Até a noite de ontem, eles não tinham qualquer previsão oficial sobre quando serão realizados os sepultamentos. Na Bahia, familiares ainda aguardavam o translado do corpo de Carlos Alberto para Salvador.
- É mais fácil os corpos serem trazidos da Antártica para o Brasil do que sair do Rio de Janeiro e ir para Salvador? Esta é a pergunta que eu faço às autoridades. Onde está a sensibilidade? Os corpos já foram liberados - desabafou Evanira Santos da Costa, de 40 anos, cunhada de Carlos Alberto, cuja família mora em Vitória da Conquista, na Bahia. - A Marinha fez uma cerimônia dizendo que eles eram heróis para dar uma resposta rápida para quem? As informações são desencontradas. Ninguém fala nada para a gente. Que entrave burocrático é esse? Faço um apelo à presidente Dilma, ao Ministério da Defesa e ao governo do Estado do Rio: estou sem trabalhar há 15 dias por causa deste sofrimento
O drama de Evanira é compartilhado com o da família de Roberto. A mulher do sargento, Sueli Colares dos Santos, de 42 anos, não sabe mais o que fazer. Ela conta que ontem deu uma procuração a um advogado da Marinha, que passará a cuidar dos trâmites legais para evitar mais transtornos. Moradora de Nilópolis, na Baixada Fluminense, Sueli passa a maior parte do tempo na casa dos pais, em Anchieta, na Zona Norte do Rio, e não sabe quando vai poder enterrar o marido, com quem tem dois filhos, Alan, de 14 anos, e Aline, de 18. - É estresse demais. A gente fica angustiada. Os amigos ligam para saber sobre o enterro e não sabemos o que dizer. Todo esse processo está lento. Já era para terem resolvido tudo. Eu não tenho mais vida. Só Deus mesmo para fazer com que eu e meus filhos superemos essa dor - disse Sueli, com uma foto de Roberto nas mãos.
Irineu Lopes dos Santos, de 46 anos, irmão do sargento morto, presta serviços à Marinha como técnico de controle de qualidade. Ontem, ele estava desolado com a situação. Sem saber o que fazer para agilizar o sepultamento, lamentou: - É atípico todo esse episódio. A família, claro, fica ansiosa, desgastada. Estamos preocupados. Hoje (ontem) não sabemos quando vamos enterrar o meu irmão. Os amigos da própria Marinha, os pesquisadores e os alunos de Roberto no judô nos procuram todos os dias. Meu irmão era muito querido. Dependemos agora desta burocracia.
A identificação dos corpos foi realizada pelo Instituto de Pesquisa e Perícia em Genética Forense da Polícia Civil do Rio. Na cerimônia realizada na Base Aérea do Galeão, os militares receberam homenagens e foram promovidos a segundos-tenentes. O vice-presidente Michel Temer, e o ministro da Defesa, Celso Amorim, além dos comandantes das três Forças Armadas, participaram da solenidade. No mesmo dia, a presidente Dilma Rousseff afirmou que o Brasil é um país formado por "heróis anônimos" e anunciou também que a base do país na Antártica seria reconstruída. À época, Dilma reconheceu que a estação, antes do incêndio, já estava precisando de obras.
Procurada pelo GLOBO ontem, a assessoria da Polícia Civil informou que os corpos já estavam liberados para os enterros e que não sabia os motivos pelos quais os sepultamentos não ocorreram até ontem. A diretora do IML do Rio, Naura Aded, também foi procurada, mas não quis falar sobre a demora nos exames. A Marinha não retornou as ligações e não respondeu aos questionamentos do GLOBO para explicar a demora nos enterros.
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