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quarta-feira, 4 de janeiro de 2012


Quarta, 4 de janeiro de 2012, 10h09 Atualizada às 10h26

AGU: Municípios não sabem lidar com repasses e ajudam corrupção

Dayanne Sousa

O advogado da União, Tércio Issami Tokano, avalia que a falta de capacitação nos municípios é a principal vilã da corrupção no Brasil. Em entrevista a Terra Magazine, o diretor substituto do Departamento de Patrimônio e Probidade da Procuradoria-Geral da União afirma que a má administração de repasses do governo federal é a maior responsável pelo aumento dos desvios.

- Há prefeitos semi-analfabetos, com equipes sem condições de administrar repasses. Há erros primários em licitações - comenta, sem ignorar que, em muitos casos, os administradores agem de "má-fé".

Nos últimos três anos, a Advocacia Geral da União (AGU) resgatou cerca de R$ 1 bilhão desviados em corrupção para os cofres públicos. O volume é considerado um recorde na história brasileira. A notícia positiva esbarra em outro dado. Segundo o jornal Folha de S.Paulo, somente em 2011, a Polícia Federal detectou desvios de mais de R$ 3,2 bilhões. Para Tokano, números tão altos se explicam pelo aumento dos convênios que o governo federal firma não só com Estados e municípios, mas também com organizações não governamentais (ONGs).

- De cinco a seis anos pra cá, o governo federal aumentou muito os repasses e convênios. Repasses tanto para Estados e municípios como para entidades, as famigeradas ONGs. E nem todas cuidam tão bem disso. Então, quando aumentam os repasses, aumentam os desvios.

Leia a entrevista.

Terra Magazine - A AGU contabilizou R$ 1 bilhão recuperado após desvios da corrupção em três anos. É um volume alto.
Tércio Issami Tokano - Ao longo dos últimos anos, a recuperação de recursos pela AGU tem sido bem expressiva. Antes que isso signifique que "nunca se roubou tanto", é preciso entender esses números. Isso se deve a dois fatores. O primeiro é o governo federal, de cinco a seis anos pra cá, ter aumentado muito os repasses e convênios. Repasses tanto para Estados e municípios como para entidades, as famigeradas ONGs. E nem todas cuidam tão bem disso. Então, aumentou o volume de recursos. E, quando aumentam os repasses, aumentam os desvios. O segundo fator é que houve uma estruturação da AGU para cumprir esse papel de recuperação.

O jornal Folha de S.Paulo publicou dados da Polícia Federal de que em apenas um ano foram detectados desvios de R$ 3,2 bilhões. É muito mais do que se consegue recuperar?
A PF tem um foco maior na questão criminal. Depois que é feita a investigação e instaurado inquérito, isso vai para o Ministério Público. Demora muito para se conseguir uma punição. Nós da AGU temos uma parceria para que entremos com uma ação cível, de recuperação dos recursos. Os delegados são orientados a encaminhar para a AGU.

Então não quer dizer que toda operação resulte numa ação para recuperação de recursos?
Não. Existe uma orientação normativa, mas ela é relativamente recente. Nem todo delegado sabe dela e encaminha os casos para a AGU. Muitos encaminham apenas para o Ministério Público, que também tem legitimidade para entrar com ações de improbidade.

De toda forma, é bastante claro que o volume desviado ainda é muito maior que o recuperado, não?
É absolutamente certo isso. Temos um índice de recuperação de recursos com base naquilo que ajuizamos num ano e recuperamos no mesmo ano. Nem sempre o dado é o mais fiel, pois há recuperações que levam até dez anos. Ressalvado isso, o índice mostra que em 2003 recuperávamos menos de 1% do ajuizado. Era ínfimo. Hoje já é algo em torno de 15%. Ainda é pouco, mas já é muito mais do que há alguns anos. A gente não consegue recuperar tudo porque há um descompasso entre os fatos. Até o caso ser investigado, apurado e haverem provas, há um lapso de tempo. Mesmo depois disso, é preciso uma ação que correrá no Judiciário para a recuperação. Em tudo cabem recursos. Por isso é muito difícil. E a pessoa que rouba vai tentar diluir esse patrimônio, colocar no nome de outros, isso é uma dificuldade.

Qual foi a recuperação mais expressiva?
O caso do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, que envolvia o juiz Nicolau dos Santos Neto. O ex-senador Luis Estevão é réu em ações de execução nossa. Em 2011, conseguimos reaver R$ 58 milhões. Foi a recuperação mais expressiva da história da AGU.

A Controladoria Geral da União (CGU) tem dados que mostram que a maior parte dos casos de desvios ocorre nas administrações municipais. Mesmo com relação ao volume recuperado, isso faz sentido? O maior volume desviado está em casos nos municípios?
Sim. Muitas vezes por má fé, outras por ignorância. Há prefeitos semi-analfabetos, com equipes sem condições de administrar repasses. Há erros primários em licitações. Nos órgãos federais, os desvios são mais bem elaborados e há órgãos de fiscalização mais atuantes. O que é mais forte nas recuperações da AGU são irregularidades detectadas pelo Tribunal de Contas da União. A maior parte, sem dúvida, é em face de ex-prefeitos e ex-secretários municipais.

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